sábado, 30 de junho de 2018

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Cântico

Cântico dos cânticos,
Vindo da solidão.

Ela não me beijará,
Pois não há beijos nas bocas
E vinho em abundância
Sevicia o amor.

Nenhum óleo,
Nem mesmo olhos são bons,
Nem percorrem meu colo
Num amar entre jovens.

Imperativo: arrasta-me!
Supliquei que corresse
E, rei, conduzisse-me ao seu quarto
Para gozarmos e regozijarmos
O vinho seviciante
Do amor dos amantes.

Se és negro de beleza rara,
Filho da cidade cinza,
Sou como as ruínas augustas
De um bar inconsolável.

Renegaram-me e renegam-me
Pois sou acinzentado.
Foram as fuligens que deram piche,
Guardando automobilísticas impossibilidades:
Nem na vida avancei.

Conte-me se há uma amada
Para mi'alma malamada,
Reservada em escanteio,
Escondida na sombra do meio-dia!
Quero ser o homem ao léu,
Aguardando que se me tirem o véu
E me podem como um carneiro.

Se não houver,
Direi a mim mesmo:
Sois o mais belo dos sozinhos,
Vai-te embora escrever poemas ao relento,
No pomar, na chuva e ao vento,
Junta-te ao remanso dos ascetas.

Mas quero amar e comparar
U'a mulher com o palácio da alvorada.

Pô-la-ia com os pingentes mais ricos,
E nos colos, colgemas e poemas.

Brincos de penas, num novo ambulante
Compraria e dar-lhe-ia com sorriso prateado.

Uma moça mimada,
Minha amada seria.
Durma em meu ombro, ventre.

Um cacho de frutas,
Paixão é para mim
Natureza morta entre os cacos das ruas.

Minha amiga não é bela,
Revoa como pomba quando me achego.

Nem belo, nem amado,
Sei ser meigo
Sonhando com um leito de ramos frescos.

Quero encher de cidra nossos corpos,
Deita-te em minha cama como cipreste.

segunda-feira, 25 de junho de 2018

antifilosófica

não sei de nada saber
quando os lábios me beijam.

que sei de calar as paixões
quando os pelos sibilam?

como amar o amor,
como cegar as constelações
de cheiros
que os cabelos inspiram?

o seu sexo,
o seu sumo
valem mais do que máximas imperiais.

o sabor do amor é a ambrosia dos fluídos.




quinta-feira, 21 de junho de 2018

Amor

Naufragar em ilha hostil,
Ou boiar no mar tormento,
O amor é duro alento,
Do morrer, ele é o estio!

É beijar-te a carne nua,
As dobras lisas das coxas,
E deixar-te as ancas roxas
Percorrendo a língua tua

Com a gramática da pele.
Pois te amo com o ardor
Do amante que atrele

O morrer em ti por dentro,
Em tua carne que desventro,
C'o cálido e puro amor.

Cantada

Você, moça branca como a neve,
Só em tua boca me posso sentir leve.

Você, moça branca como a neve,
Louca, me controla e meu sangue ferve.

Você, moça branca como a neve,
Assoma e assombra a tua beleza,
Rima, soma e delicadeza.

Em você, moça branca como a neve,
O sorriso de menina transformando-se em mulher,
E o meu riso assombrado,
Admirando seu pecado,
Nada, nada, nada...
E mais quer!

Nota de um adolescente de dezessete anos


"Enquanto os meninos perseguem ambiciosamente o sexo alheio e sonham com a fama e o sucesso, me contentaria em transformar a mim e ao mundo. Seus ídolos são jogadores de futebol e cantores. Eu desejo ser apenas um misto de Antonio Cicero com Gonzaguinha. Um homem, afinal."

terça-feira, 12 de junho de 2018

Redondilha do dia dos namorados

MOTE
Namorada não a tenho
Nem a busco, sofro dela,
Aguardo pela chancela
Do novo amor um empenho.


VOLTA
Não tenho a moça adorada,
Não há adoçar da visão.
Da moça, doce aflição,
Apenas da dor, debandada.
Não há mulher bem amada,
Não há olhos a me olhar;
Desejo o lábio beijar
E amar em bela alvorada.

domingo, 10 de junho de 2018

Amor de apostas

Sinto a falta de dedos dedilhantes
Sobre a carcaça da minha epiderme,
Sinto a falta de lábios bem errantes
Sobre meus lábios, sobre o corpo inerme,

Inebriado e entregue ao feitiço
De uma mulher, um ser amado e amante,
Que eu ame tanto e que também me encante,
E me liberte do estado enfermiço

Da vida; sou como um tolo lançado
A um sorriso, ao bem do que me chega,
Que não pareça o bem da que me nega

O amor doce e louco e apaixonado.
Que me dedilhe ventre e mãos e costas,
Me escandindo em um amor de apostas.

terça-feira, 5 de junho de 2018

Beijo de tisana

Andaste em prados sumida,
Fermosa dama serrana,
Envolta numa má trama
Desta matrona que é a vida.
Surgiste-me em dia triste,
Meu bem, tu me acudiste.

Andaste em serra fremida,
Mulher morena, marrana,
Chamaste-me pr'uma gincana,
Pr'um brinde na noite renhida.
Mas, moça, essa noite existe?
Pegaste-me a mão num chiste...

Andaste, tu percorreste
Os céus, beleza cigana,
Dama, teu beijo é tisana,
Olhar é flor de moleste.
E quando tu te despiste,
Os céus inteiros luziste!

Andaste em campos sulinos,
Helena, linda aleivosa,
Querendo alcançar, airosa,
A ponte do amor divino.
Amor, porém, tu sabias
Não é eros, mas philia.

Andaste, graciosa e esbelta,
Com tua revolta, e aplana
Tornar com a beleza gitana
O mundo, palco e ribalta.
Morena, peço que sorria,
Teu riso é mia poesia.

sábado, 2 de junho de 2018

Se de amor morresse um dia

A  A. L.

Se de amor morresse um dia
Naufragado em lábios teus,
De amor viver soía
Em teus lábios um adeus.

E que em teu moreno corpo,
Teu olhar, tua voz, tua tez
Montanhosa onde escarpo
Perfilhando a insensatez,

Encontrasse a esperança,
Fero amor,  morena Inês,
Confundindo a tua dança
Em meu corpo e lividez.

E se um dia me alcança
Novamente esse ardor
De encontrar em tua trança
Um alívio, um torpor,

É por tua residência,
Por teus bichos, por teus nichos,
Nessa tua resistência,
Em tua língua, teus caprichos.

Se de tudo isso morresse,
Morena dos olhos lindos,
- Morena que tu me cresse:
Esqueça os amores findos-

E recorde o que fizeste,
O quanto me encantaste,
O beijo tu que me deste,
Pro beijo fui em arraste,

Pois moça maravilhosa,
Se de amor morresse um dia,
Lembraria de ti cheirosa,
Morreria em alegria.