quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Gênese

Deus na tradição da bíblia hebraica não criou Eva da costela de Adão; ou melhor, não somente. Se lemos o versículo 27 do Gênesis 1, vemos que "Deus os criou, homem e mulher os criou". O primeiro "homem" era um Adão-homem e Adão-mulher.

Apenas no Gênesis 2 Deus cria novamente uma mulher da costela de um "Adam" puramente homem. São narrativas conflitivas, parece-me.

Prefiro a primeira, que não torna Eva uma dependente da carne adâmica; ademais, preserva a dotação divina da verve e apetite intelectual da mulher: Eva preserva de Deus a dotação do intelecto em sua imensa curiosidade.

Muitas mulheres bíblicas possuem uma imensa sensualidade e transgressão, combinadas com uma imensa sede pelo pensar. Poderíamos dizer que isto é preservado de Lilith, um demônio feminino talmúdico; prefiro pensar que provém da primeira Eva, da parte mulher do humano, criado diretamente por Deus - e realçando o que há de mais íntimo em nossa condição: se há uma ação tipicamente feminina, este verbo-ação é firmeza, é o lutar.

segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Saudade

Singra os mares revoltosos do meu peito
Como u'a nau a saudade silibrina,
Verde água, ver-te a mágoa, amorfina
E naufraga a alma, e o espírito desfeito.

A imagem é o presente escorreito,
Mas arranco os olhos para não mais te ver,
Pois tua falta é parte minha a fender
E de ti recordo e sofro teu trejeito.

Em minha casa, em tua rua, e na vida,
Protetora, fostes também minha morada,
Fostes mais que minha deusa adorada,

Sangro tanto, fostes nossa Aparecida.
Em meu peito revoltoso contra o céu,
Rogo ver-te, rogo mesmo sendo incréu.


quinta-feira, 4 de janeiro de 2018

Tempo perdido

Durante muito tempo, deitava-me cedo
Tão cedo quanto não me levanto,
Pois envolvido me via no encanto,
De amor, prazer, que adormecer era degredo,

Deitava-me cedo, pensando em coisas mil,
No amor de Delfina por Adolfo,
Dessabor, que aumenta, é balofo,
Lembrando o passado, persistente, coisa vil.

Vivia em mil recantos, pois literato
Somente é homem; deixo pra alguém
desse meu conto viver do que canto,

Se sobrevivo lendo, se não vivi ,
Vivo sabendo que apenas sei bem
O desvairar de poeta que atrevi .