segunda-feira, 16 de junho de 2014

A Arte da Frieza

Um dia aprenderei
A arte da frieza
Alçada como lei
em tua fina indelicadeza.

Talvez uma vaga certeza,
Ou uma desdita qualquer,
Invada e ocupe-me a reza,
teu posto, teu corpo, mulher.

Sei talvez não mais importe
ou comporte a presença febril.
Assombra-me o teu ardil.

Sem ti, sem sorte, nem norte,
Sem rosto, sem nome, sem brio.
Apenas vazio. Apenas vazio.

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Último Poema

Todo último poema
me parece meu último poema.

Nele tasco meu resto de vida e penso não mais caber.

Pobre de mim!
Sempre acho que a dor acaba.
O que não sei é que sempre há réstia para um último regaço.

O meu último poema é sempre
o meu último fracasso.

A morfo lógico

Mordiscando
                     amor
                               disca

amor denso
                mordência
                                 vem
                amordaçando

Amor dado
                   carnavalizado.

Bocas que devoram
mãos que se adoram
corpos que demoram

A! mora comigo?
Vai... 
          Me adora!
ME GERA
em mil tera
                 BITES
Me sufoca
                         Leve-me, india, 
                                                     à
                          tua OCA.


segunda-feira, 9 de junho de 2014

Cantada n. 3

Cantadas de todas as formas
o homem já ousou tentar
de todos os jeitos, em turmas,
na fila do banco e no bar

Pobres sujeitos tão vis,
desesperados pelo amor,
não pensam na moça que diz,
um “não!” com todo vigor.

Tenho vergonha do homem
oh ser tão pobre e vazio!
Respeite o corpo e o brio
daquelas a quem deve o nome!

Mesmo com o torpe “fiu fiu”
qual moça nunca sentiu
um medo a lhe assaltar?

Pois bem, queridas, proponho
mudanças, um amor mais livre,
Começo: vai e vive!
Depois me acolhe e sonhe

Pois se um dia te disser:
“Sigamos juntos, mulher?”
Não será de maneira fria
Vulgar, medonha... vazia.

Direi, madonna mia:
“sou poeta
quer ser minha poesia”?

domingo, 8 de junho de 2014

Lados

meu lado de dentro
no lado de fora
noves fora
meu lado de fora
no lado de dentro
desventro

no lado de dentro
vinho amor
no lado de fora
verbo calor.

unir o fora e o dentro
no
centro.

terça-feira, 3 de junho de 2014

Brecht

Se hoje a morte vier,
De forma banal... Qualquer...
Torpor que só nisto consista:
Morto vai mais um artista!

Mas se a morte é vergasta,
E infausta a vida nefasta,
Deixo de modo simplista:
Foi-se um idealista!

Caso trouxeres na boca
Nome que ainda lhe toca,
Não lhes dê muito na vista:
Só minha ideia persista!

Se hoje a morte me chega,
E nela a minha macega,
Minha partida imprevista,
Deixo-te aqui uma pista:

Em terra, só há perdão
Se enfrenta toda podridão,
Luta, chuta, resistas:
Às favas com os juristas!

Que venha em minha Cripta,
Epílogo d'obra altista,
Frase da nobre conquista:
“Já morto, e jaz comunista!”

domingo, 1 de junho de 2014

Um Dia...

Um dia ainda me lanço
Para o lado da inconsistência;
Naquela virá o remanso,
A sede, a dança e a urgência.

Um dia ainda me apego,
Me pego, me embrulho, me como,
E me afirmando, me nego.
E me libertando, me domo.

Um dia ainda te entrego
Minha vida mesquinha, o mundo...
Às vezes me acho um cego
De verso bem vagabundo...

Um dia ainda me trincho
Como aqueles pobres diabos
Que tem na voz um relincho.
Um dia – juro! - me acabo!

Um dia ainda encontro,
Um ponto, um conto, só meu.
Então eu irei ao confronto
Do mundo: este fariseu.

Um dia ainda te enfrento
Oh, jovem, estúpido e vil
Que dá mais valor ao quadril
E zombas do meu pensamento.

Um dia ainda me zombo,
Um dia não serei sozinho,
Um dia... um dia... Um tombo.
Terei a paz no meu caminho.

Um dia ainda me lanço
Para o lado da morte imensa.
Pois nela virá o remanso
Desta minha busca infensa.